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Terceira Onda da epidemia de AIDS é o tema central da terceira aula de Richard Parker na ABIA


Em sua terceira etapa de aulas Richard Parker – diretor-presidente da Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS (ABIA) – norteou a sessão desta terça feira (22/10) a partir do tópico “A Terceira Onda: Escalonando a Resposta Global frente a epidemia dos anos 2000”, na sede da instituição, no Centro (RJ), das 14h00 às 17h00.

Esse período foi salientado por Parker como “um momento de otimismo onde víamos que podíamos fazer algo para mudar a epidemia de HIV”. Segundo ele, entender os problemas da AIDS é importante para entender o contexto da Saúde Global. Focando a fala no início do novo milênio – ou a partir dele – um dos marcos destacados do período teve o UNGASS (Sessão Especial da Assembleia Geral das Nações Unidas sobre Drogas), de 2001, como resultado via Organização das Nações Unidas (ONU). Esse evento serviu como fomento para o desenvolvimento de iniciativas progressistas no campo da AIDS em todo o mundo, naquele momento.

“Existiam pessoas e ativistas maravilhosos (e) com um verdadeiro compromisso na luta contra a AIDS de todo o mundo. Inclusive políticos como Bill Clinton (ex-presidente americano) e Celso Amorim (ex-ministro das Relações Exteriores do governo Lula) entre outros. Então era uma época de ouro do enfrentamento à epidemia. Eu fico um pouco saudosista, porque eram tempos difíceis, porém mais articulado para combater o HIV/AIDS com ações (práticas). Hoje em dia eu já não vejo mais isso”, lamentou Parker.

Também se realizou nesse instante uma importante normativa do eixo que foi a Declaração de Doha sobre TRIPS e Saúde Pública, em novembro de 2001. Sobre isso, o diretor-presidente disse ter sido um caso ímpar porque permitiu atuar com exígua pressão sobre os organismos internacionais de comércio e propriedade intelectual. “Entre UNGASS e Doha houve o período mais rico dentro do HIV/AIDS e seu enfrentamento”, afirmou ele. Contudo, entre essas duas ações Parker relembrou o ocorrido em 11/09, os ataques terroristas às torres gêmeas em Nova York (EUA), que reconfigurou a ordem mundial.

“O que se instala após isso é a re-militarização das relações internacionais dos EUA no mundo, junto com seus aliados. E isso renovou não só o espírito militar, mas os gastos de recursos do governo americano, que seria com o Fundo Global. A dívida externa aumentou com questões de guerra e não de saúde”, explicou.

Pontos como observador   

Durante quase oito anos o antropólogo viveu sob uma intensa ponte-aérea entre Rio de Janeiro e Nova York, sobretudo. Isso serviu para que ele adentrasse e analisasse diferentes contrastes entre e além-fronteiras. Principalmente:

– Diferenças entre Brasil e EUA;

– A criação do Sexuality Policy Watch (SPW, Observatório de Políticas de Sexualidade);

– Novas pesquisas sobre HIV na África do Sul, Vietnã e Brasil;

– Atuação em redes transnacionais de pesquisa (na América Latina, África e Ásia).

 

“Serviu para ter uma visão comparativa muito útil sobre como diferentes atores e ações sociais eram feitas, dentro de cada cultura, no enfrentamento à epidemia”, disse. A partir de 2004 para 2005 o sucesso dos medicamentos conferiu um novo status quo à (re) biomedicalização até chegarmos hoje no que conhecemos como Prevenção Combinada. O fragmento do movimento social de AIDS cria um imenso desafio dentro do mundo ativista, pois muitos são incorporados como mão-de-obra na indústria de AIDS. Para além disso, o escalonamento do acesso ao tratamento também é um fator para desequilibrar as respostas políticas.

“O movimento político se enfraquece na terceira onda no passo do crescimento da indústria global de AIDS. O escalonamento acontece na ambiguidade entre esperança e retrocesso”, esclarece. Isso se justifica com o surgimento de programas como o PEPFAR (EUA), o Fundo Global, o Programa de AIDS na África (do Banco Mundial) e o 3 por 5 (da Organização Mundial da Saúde > OMS), entre outros, caracterizados por serem iniciativas bi e multilaterais e/ou de parcerias público-privadas.

Também se destacam outros grandes institutos de saúde global como:

– Clinton Health Acess Initiative (2005, França, Brasil, Chiele, Noruega e Reino Unido);

– UNITAID (2006)

– A partir de 2007 várias parcerias entre CHAI, UNITAID, UNAIDS e outras iniciativas.

 

“Em 2008 você começa  a virar a esquina e reduzir a mortalidade de pessoas vivendo com HIV e aquelas que recebem ou não o tratamento”, diz Parker.

 

A Re-biomedicalização da epidemia na Terceira Onda

Em meados dos anos 2010 – puxado pelo sucesso gradual na ampliação de acesso aos antirretrovirais e pela dificuldade de alcançar mudanças estruturais – uma nova esperança surge sobre as possibilidades de sucesso de respostas biomédicas frente à epidemia. Mas há construções à serem feitas, segundo Parker. Para ele “a sociedade não entra. É como se fosse uma questão individual e os coletivos não tem peso nenhum”, critica. Daí, ele levantou alguns pontos de indagação, tais como:

– Onde está o meio termo?

– Onde estão as comunidades?

– Onde está o “sexo seguro como prática comunitária’?

Atualmente , na prevenção combinada que é ofertada como possibilidade de prevenção e ação biomédica através dos eixos comportamental, biomédico e estrutural presentes nela.

 

“The AIDS Backlash” – Efeito Boomerang 

Em termos gerais o termo funciona como um efeito boomerang, mas parelelamente a isso, o diretor-presidente ainda levantou outros dois pontos sobre a questão. São eles:

– Críticas dentro da saúde global com mais amplitude e prioridade sendo dado para a AIDS;

– Uma chamada para rever eficácia de custos não tem dinheiro para todas as questões e é necessário repensar e estabelecer prioridades.

 

Debate

1 – Existe alguma questão que perpassou a terceira para a quarta onda (da epidemia) dentro da biomedicalização?

Parker: A rebiomedicalização começa a crescer mais ou menos em 2005 e se estende na quarta onda de maneira importante. Mas tem diferença de como isso é trabalhado politicamente. Porque a partir de 2010 começa o discursos do fim da AIDS e que a biopolítica vai resolver tudo. E que resulta no (discurso) que o fim da AIDS será em 2030, conforme divulgado em 2016 pelo UNAIDS (Agência das Nações Unidas para a AIDS).

Então a quarta onda superbiomedicalizada começa na terceira (onda). E a própria ONU e UNAIDS percebeu que tinha pisado na bola ao promover o fim da AIDS para 2030, fazendo doadores internacionais retirarem dinheiro e que não tinha, portanto, como voltar mais atrás. Os tratados já estão assinado entre os países, mas eles não sabem lidar com o monstro que criaram. Não foi uma coisa inteligente. Foi feito sem pensamento crítico, o que é uma pena, porque perdemos o senso crítico para nossa capacidade de inovar e refletir dentro da epidemia de AIDS.

2 – Existem outras falhas na resposta global que já foram identificados por você como aqueles vistos e apontados até aqui?

P: Esses dois modelos do PEPFAR e do Fundo Global, multi-lateral e bilateral. Ambos esses modelos você tem de forma mais ampla na saúde global com pontos positivos e negativos. E tem algumas das limitações de visão política, conservadoras que criam barreiras e limitam o trabalho e esforços técnicos. Mas tem muito mais. E uma das tarefas que eu ainda não completei e preciso escrever no (novo) livro é identificar essas outras falhas.

3 – Como profissional de saúde atuando na quarta onda, como faço para continuar desempenhando meu trabalho com tantos desafios?

P: Acho que isso é um dos exemplos dessa ótica do fim da AIDS que permite o Ministério da Saúde, por exemplo, trocar o nome do programa de AIDS para uma pasta de doenças crônicas e agravos. Então é difícil responder isso. É preciso resiliência e saber que não será com visões conservadoras ou precipitadas que se resolverá o problema da saúde global.

Texto: Jean Pierry Oliveira e Jéssica Marinho

Fotos: Jéssica Marinho

 

 

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