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“Ver milhares de pessoas morrendo diariamente pra uma doença e ainda ter pessoas contra a vacinação é desesperador”, afirma jovem carioca residente em SP.


Foto: Arquivo pessoal

O cinema é conhecido no mundo todo como a “sétima arte”. Um meio de produção cultural e audiovisual que desperta fascínio desde a época dos irmãos Lumiere. Seja na comédia, na aventura, ação ou animação os filmes têm a característica de nos fazerem “viajar” e embarcar em qualquer história como se fôssemos nós aqueles vivenciam o enredo exibido.

Tamanha paixão saltou aos olhos, chegou no coração e foi fundamental para que Thaís Carlos, de 26 anos, decidisse pela formação na área durante a graduação. O que ela não poderia imaginar é que, um dia, estaria dentro de uma verdadeira história – não de ficção, mas da vida real. A classificação indicativa é livre e a forma como cada um enxerga, lida e luta contra a questão é “livre”. Além disso, a categoria flutua entre o horror e o drama de tempos sombrios onde, no Brasil, não sabemos quando – e como – vai acabar. A protagonista se chama coronavírus e sua característica principal é a pandemia.

A jovem do subúrbio carioca, cria de Quintino – zona norte do Rio de Janeiro – atualmente reside na zona sul da capital paulista e vislumbra de seu home office reflexões importantes sobre como a doença afeta as duas maiores cidades do país. “Acho que a maior diferença entre ambas é a questão da violência e mobilidade. Quintino, assim como outros bairros do subúrbio carioca, mesmo no meio de uma pandemia ainda sofre com tiroteios constantes e mais violentos. Quanto à pandemia, vejo que no meu bairro privilegiado, por ser na Zona Sul de São Paulo, que a grande maioria das pessoas usam máscaras e quase todos os estabelecimentos estão fechados e trabalhando com delivery. Mas no geral tudo quase sempre está fechado, às vezes me sinto num filme de distopia com as ruas vazias”, sintetiza.

Crítica acerca da politização da vacina, Thaís também se mostra estarrecida com o negacionismo de parte da população com a prevenção do dia a dia, fala sobre sua relação com os pais – profissionais da saúde -, sexualidade, HIV/AIDS e outros assuntos.

Confira a entrevista na íntegra:

 

Apresentação    

1- Nome completo e Idade 

R: Thaís Carlos, 26 anos.

2 – Você reside em São Paulo, na capital. Mas é de Quintino, subúrbio do Rio de Janeiro. Quais as principais diferenças e desafios entre as cidades, principalmente agora na pandemia?

R: Acho que a maior diferença entre ambas é a questão da violência e mobilidade. Quintino, assim como outros bairros do subúrbio carioca, mesmo no meio de uma pandemia ainda sofre com tiroteios constantes e mais violentos levando em consideração o som de armas cada vez mais pesadas e seus moradores dependem do transporte sucateado e bem mais caro da Supervia. Enquanto aqui, atualmente, paga-se 4,40 e dá direito a integração com metrô que liga praticamente todos os cantos de SP, enquanto no RJ.

Quanto à pandemia, vejo que no meu bairro privilegiado, por ser na Zona Sul de São Paulo, que a grande maioria das pessoas usam máscaras e quase todos os estabelecimentos estão fechados e trabalhando com delivery, alguns poucos restaurantes trabalham na clandestinidade escondendo os clientes atrás de cadeiras e mesas empilhadas. Mas no geral tudo quase sempre está fechado, às vezes me sinto num filme de distopia com as ruas vazias, parece que não existe mais ninguém enquanto em Quintino parece que nada mudou: comércio funciona normalmente, os vizinhos se aglomeram durante jogo do Flamengo, fazem festas infantis. Eu me sinto uma estranha usando máscara já que a grande maioria não vê necessidade nisso.

O mais preocupante é que especialmente as crianças são as que nunca vejo usando. Acho que o maior desafio entre as duas cidades é o mesmo que em todo o Brasil – convencer os negacionistas a usarem máscara, ficarem em casa e exigirem seu merecido auxílio, seja com processo ao governo, seja protestando não declarando IR (Imposto de Renda). Alguma coisa tem que ser feita contra os governantes, não podemos impor lockdown sem antes garantir a segurança das famílias, porém, mais do que nunca precisamos de lockdown.

3 – Como é a relação com sua família?  

R: Sou eternamente grata por ter uma família que sempre me acolhe e incentiva minhas decisões, sei que foi difícil pra eles, assim como pra mim, me deixar morar longe em outro estado, mas sabem que fiz isso pra crescer profissionalmente e lutar pela minha qualidade de vida e por isso sempre me ajudam.

4 – Sobre a pandemia, de que forma o isolamento social causado pelo coronavírus afeta ou já afetou sua saúde mental? E o que tem feito para distrair a mente e evitar os gatilhos psicológicos?

R: Sinto que após um ano de pandemia, passei a ter crises de ansiedade bem intensas, coisas que não havia tido em 2020, pois continuava seguindo em frente com a esperança de que em 2021 estaríamos vacinados. Quando 2021 chegou e bateu aquele sentimento de desesperança, desandou tudo. Passei algumas noites em claro com batimentos acelerados e dificuldade de respirar, pois não estava conseguindo mais controlar aquele sentimento de que tudo só iria piorar. O que me ajudou a passar por esses momentos é ter aprendido na terapia com a psicóloga a identificar o funcionamento de uma crise de ansiedade, e aos poucos ir me acalmando por conta própria.

Outra coisa foi a série Headspace, na Netflix, de meditação guiada que também me ajuda a pensar em outras coisas e ir dormir. Meu estilo de vida sempre foi sair de casa o máximo que podia, pois sempre gostei de conhecer lugares novos e aglomerar todos os meus amigos em sociais na minha casa e com a pandemia tive que mudar drasticamente. E me adaptar a ficar o tempo todo sozinha em casa (era) o que me gerava um certo estresse e hoje já é mais ameno. O que me distrai são jogos online e as mesas de RPG com meus amigos que antes eram uma vez no mês, presenciais, e agora são quase toda semana por Discord, a vantagem é que nunca vi a ficha de um personagem meu evoluir tão rápido, (risos).

5 – Como você avalia a politização das vacinas e medidas de lockdown, no RJ e em SP? 

A politização das vacinas é sem dúvidas o momento mais assustador, cruel e estúpido que já vi na vida e nunca imaginei que tomaria tamanhas proporções logo no Brasil, um lugar que sempre foi referência mundial em campanhas de vacinação. Ver milhares de pessoas morrendo diariamente pra uma doença que hoje há prevenção e ainda ter pessoas se recusando ou espalhando notícias falsas contra a vacinação é desesperador, ainda mais quando essa postura é incentivada pelo presidente da república. Acredito que nos dois estados a maioria das pessoas não esteja cumprindo, seja por falta de opção infelizmente ou por negacionismo, vulgo, falta de caráter, as medidas de isolamento social tendo em vista a quantidade de mortes. Mas o que eu vejo no meu dia a dia e pelas notícias é que as medidas de lockdown estão sendo mais rígidas aqui em SP do que no RJ, que ainda tem muitos estabelecimentos funcionando normalmente e pessoas lotando as praias mesmo com restrição.

Relacionamento e Prevenção 

6 – Sobre a questão da prevenção, você tinha abertura para conversar isso dentro de casa? Ou o assunto era tabu? Quando tinha dúvidas ou dilemas nesse sentido, como buscava resolvê-los?

R: Sim, me sentia confortável na medida do possível de conversar com a minha mãe desde muito nova. Quando criança ela usava coisas mais lúdicas como: ‘tome cuidado e nunca acredite em estranhos na rua porque eles vão te oferecer coisas e te levar pra “fazer sabão”. Inclusive essa medida me salvou de ser sequestrada provavelmente quando criança pois um estranho se aproximou de mim numa loja dentro do shopping perguntando se gostava das bonecas e queria uma, meus pais estavam no corredor ao lado e acharam que estava em segurança por estarem muito perto. Por eu ter medo de “virar sabão” corri até eles e rapidamente o estranho sumiu, e nunca vi meu pai tão furioso procurando por ele. Minha mãe sempre me explicou tudo abertamente principalmente quando eu entrei na quinta série e comecei a perguntar significado de piadas de duplo sentido que os garotos faziam.

Sem rodeios ela explicava todas as conotações sexuais e o fazia pois sabia que essa era a melhor forma de eu me defender sozinha. Reconheço que tive o privilégio de nascer numa família onde meus pais são profissionais de saúde, e por serem enfermeiros que trabalharam em postos de saúde, sempre ensinaram no trabalho as formas de prevenção pra população. Logo, em casa não poderia ser diferente. Já meu pai quando mais nova já falava sem dar muitos detalhes, ficava muito por alto por ficar claramente constrangido até mesmo pra me explicar como colher urina pra exame (risos). Hoje, adulta, já não existe mais isso e falo abertamente sobre todos os assuntos.

7 – Jovens de 15 a 29 anos são grupos populacionais, atualmente, que lideram os índices de infecção por HIV/AIDS no Brasil. Ao mesmo tempo, nunca se teve tanto acesso às informações e outras tecnologias. Em sua opinião, o que faz com que a juventude se infecte tanto por HIV?

R: Acredito que as pessoas não levam em consideração que ter acesso a internet não significa que todas as pessoas saibam usar a internet. Ano passado havia lido uma pesquisa que mais de 50% da população brasileira acredita que o Facebook é a internet, ou seja, a maioria não sabe fazer uma pesquisa no Google e acha que a única informação são páginas e correntes em redes sociais e isso é muito preocupante. Acredito que é uma ilusão falar em mais acesso à informação quando as pessoas não sabem acessá-la.

Acredito que elas só têm acesso a desinformação tendo em vista a situação que estamos hoje. E é claro que não podemos descartar também a quantidade considerável de jovens que não se previnem por negligência ou das mulheres que por conta do machismo são coagidas pelo parceiro a terem relações sem preservativo.

8 – A Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS (ABIA) trabalha, bem como o Projeto Diversidade Sexual, Saúde e Direitos entre Jovens, envolvida em questões do HIV/AIDS, prevenção, direitos humanos e justiça social para com populações vulneráveis (soropositivos, LGBTs, comunidades, jovens, negros, mulheres etc). Você considera que esses tipos de ações são importantes? Por quê?

R: São medidas extremamente necessárias. Além das notícias nas redes, fico muito impactada com a situação das minorias com a pequena amostra de realidade que tenho contato indiretamente através da minha mãe que já trabalhou/trabalha em hospitais e postos de saúde públicos em bairros periféricos desde muitos anos. É muito descaso com essas populações, que tem muitas limitações seja financeiro, seja por falta de investimentos em infraestrutura – a quase tudo: água, saneamento, escolas, internet… Coisas que são indispensáveis para ter qualidade de vida. Logo todo apoio, orientação e ajuda é essencial.

Futuro

9 – Acredita que sairemos diferentes e que tiraremos lições importantes para o mundo pós-pandemia?

R: Acredito que algumas pessoas sim, mas a maioria infelizmente não. Honestamente, eu não vi uma mudança drástica no comportamento das pessoas, exceto quando elas são forçadas a usar máscara por algum estabelecimento. Resumidamente, quem já tinha condições de se sustentar e era alheio as dificuldades do outro continuou mais alheio e confortável na sua bolha dentro de casa ou organizando festinhas em sua mansão, ou viajando pra fora. Quem era negacionista continuou negacionista independente de quantas pessoas morreram a sua volta. Acho que a maior lição que podemos tirar é que a maioria das coisas que fazíamos de forma presencial pode ser feita de forma online gastando menos recursos, agora se a maioria dos empregadores vão aderir a isso eu já não sei. Por exemplo, tem muita gente que não confia no funcionário de home office porque acredita que estão “trabalhando menos”. Grande ilusão.

Eu por exemplo, a única diferença entre trabalho presencial e home office pra mim é que agora eu posso deitar na minha cama na pausa de 1 hora pro almoço – marcadas e contadas no aplicativo do celular de bater ponto – ao invés de alguma cadeira dura de praça de alimentação. Isso não significa trabalhar menos, significa ter mais dignidade ao trabalhar.

10 – Qual sua expectativa para a vacinação contra o coronavírus no Brasil? O que pretende fazer assim que for vacinada e que agora não pode?

R: Tenho a expectativa de voltar a ter a rotina de antes, ver pessoas na rua se divertindo como antes em eventos espalhados pela cidade. Sou formada em Cinema e me entristece muito ver as salas fechadas por certo período e estar a mais de um ano sem frequentá-las. Primeira coisa que vou fazer será marcar uma festa pro máximo de amigos que couberem na minha casa e comprar ingresso pra todas as exposições de arte, sessões de cinema e festas e shows que puder.

 

Texto: Jean Pierry Oliveira

Foto: Arquivo pessoal

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