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“Faltou um pouco de discussão sobre o contexto social e político no qual a sífilis recrudesce no Brasil e na região Sudeste”, afirma vice-presidente da ABIA, Veriano Terto, sobre Seminário Interfederativo de Respostas a Sífilis.


Foi realizado entre os dias 26 e 27 de abril, na cidade de São Paulo, o Seminário Interfederativo “Resposta Rápida à Sífilis nas Redes de Atenção” da região Sudeste, organizado pelo Ministério da Saúde.

O evento teve como objetivo inicial firmar um pacto de colaboração na região com o “Projeto Sífilis, Não”. De acordo com Adele Benzaken, diretora do Departamento de Vigilância, Prevenção e Controle das IST, do HIV/Aids e das Hepatites Virais do Ministério da Saúde o primeiro passo da resposta a doença foi dado, “Acho que os seminários fora a capacitação dos apoiadores tem o intuito principal de marcar o início dessa resposta rápida. E então eu acho que para aqui três anos a gente tenha realmente “Sífilis, não” nesse Brasil continental com tantas realidades diferentes e que nós vamos ter que ter realmente planos diferentes adaptados para cada local e cultura diferente. ”

Outras edições deste seminário que já haviam sido realizadas em outras regiões do país e reuniram profissionais da saúde do Norte, Nordeste, Centro-Oeste e Sul. Nesta edição além dos participantes de São Paulo, os Estados do Rio de Janeiro, de Minas Gerais e do Espírito Santo enviaram representantes que atuam na área da saúde nas esferas municipal, estadual e federal. Um dos participantes foi Veriano Terto Jr, doutor em saúde coletiva pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro e vice-presidente da Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS, que em um breve bate-papo com a jovem assistente de projetos Jéssica Marinho falou sobre as suas impressões acerca do seminário. Confira!

 

Jéssica Marinho: Dentro da pauta organizada pelo Ministério existiu algum espaço para tratar da sífilis entre jovens?

Veriano Terto: Então antes de responder essa pergunta só lembrar que eu participei do Seminário Interfederativo de resposta Rápida a Sífilis nos dias 26 e 27 de abril de 2018, em São Paulo. Esse seminário faz parte do lançamento de um amplo projeto nacional do Ministério da Saúde que se chama: “ Respostas Rápidas a Sífilis nas Redes de Atenção”, e tem como mote a expressão “Sífilis, não”. Trata-se de uma louvável iniciativa que visa criar uma resposta governamental ao aumento da incidência de sífilis no Brasil, especialmente em algumas populações mais vulneráveis. O aumento de casos é registrado de forma preocupantes nas populações de transgêneros, jovens gays, mulheres prostitutas – e a questão da sífilis congênita também é bastante alarmante no país inteiro.

Para mim foi uma oportunidade muito importante participar, enquanto sociedade civil, e aprender um pouco mais sobre a dimensão nacional e regional da sífilis e também para tentar contribuir no debate. O que me chamou atenção é que enquanto o seminário tinha um número representativo de gestores e profissionais de saúde, o que é muito bom, dos quatro Estados da região Sudeste, avalio como pequena a participação de colegas da sociedade civil e também da academia. Senti falta, em especial, de cientistas sociais que poderiam contribuir com outras visões (antropológica, sociológica, histórica etc) para além da biomédica.

JM: No geral quais foram as suas impressões sobre o evento?

VT: O evento não tinha o intuito de definir e deliberar um plano de enfrentamento para a região Sudeste. Entendi que o seu objetivo era recolher informações, ideias e sugestões nos trabalhos em grupo para compor um plano de enfrentamento ainda em construção. Para mim foi bastante estimulante o trabalho em grupo, já que pude conhecer um pouco da realidade de municípios da região Sudeste e principalmente da região Metropolitana I, do Rio de Janeiro.

De forma geral, acho que o seminário teve um enfoque muito técnico, o que tem o seu lado positivo e necessário. No entanto, faltou um pouco de discussão sobre o contexto social, cultural e político no qual a sífilis recrudesce no Brasil e em especial na região Sudeste. Porque ela recrudesce? Quais são os determinantes sociais que favorecem sua disseminação atual? É bom lembrar que a sífilis é uma doença bastante antiga, uma doença sexualmente transmissível curável, que tem um tratamento relativamente simples e eficaz e com um arcabouço de lições sobre sucessos e fracassos no seu enfrentamento ao longo de mais de 100 anos, pelo menos. Por que nos dias de hoje há este aumento de casos? O que poderíamos aprender desta história de sucessos e fracassos na resposta à sífilis no Brasil e no mundo?

JM: Partindo desse ponto você acredita que a resposta à epidemia de sífilis ao enfatizar mais os aspectos biomédicos e epidemiológicos seria suficiente para explicar o porquê do aumento de casos?

VT: Eu acho que é preciso ter uma visão interdisciplinar e intersetorial no enfrentamento desse problema. Claro que conhecer e medir a frequência/incidência dos casos é muito importante, da mesma maneira que é importante entender o contexto social em que estes números são registrados, assim como o contexto econômico, cultural no qual as pessoas estão inseridas, bem como ouvi-las sobre o tema, para que tenhamos explicações mais amplas para um problema de saúde tão complexo.  Seria o nível de informação sobre a sífilis muito baixo na população em geral e nas populações mais vulneráveis? São valores culturais que impedem a prevenção? O estigma que envolve a sífilis é um obstáculo ao seu enfrentamento? As pessoas estão se infectando porque não tem acesso à educação, informação, ao preservativo, ou no caso da sífilis congênita, acesso a um pré-natal de qualidade e no momento certo? Ou há dificuldades de buscar um serviço de saúde? Então tudo isso a gente precisa conhecer melhor para poder ter uma abordagem mais integrada que envolva tantos os aspectos sociais, quanto os biomédicos.

JM: Ao fim da reunião quais foram os resultados, os esforços que o Ministério se propôs a fazer com relação a esse aumento de casos?

VT: Percebi que a implementação desse projeto prevê uma série de atividades tanto, no lado da prevenção, como oferecer mais informação para a população sobre a sífilis, sobre as formas de transmissão e as formas de evitá-la e/ou tratá-la, assim como de assistência, de cuidado com as pessoas que sofrem com a sífilis. Pude escutar no seminário- e me surpreendeu muito – falas que relataram dificuldades dos profissionais de saúde de fazer o diagnóstico correto, outras quanto ao conhecimento sobre como administrar o medicamento para sífilis, até mesmo de aplicar uma injeção nas pessoas travestis por conta do uso de silicone na região dos quadris. Então parece que há um despreparo muito grande também das próprias equipes de saúde para enfrentar o problema, além de uma série de representações sociais errôneas baseadas em juízos de valor, que as pessoas ainda têm na cabeça sobre a sífilis. Por isso seria muito importante conhecer o que a população (incluindo os profissionais de saúde) pensa sobre a doença e qual o seu nível de informação, como lidam com esse fenômeno no seu dia-a-dia, principalmente com e entre as populações mais vulneráveis.

JM: Você acredita que esse trabalho de saber como a população lida com a sífilis poderia partir do movimento social também?

VT: Sim, a integralidade de saberes, visões e experiências é fundamental para enfrentarmos problemas de saúde pública. Tem que envolver o movimento social, a sociedade civil organizada, os profissionais de saúde, os profissionais das ciências sociais. Enfim, se trata de criar um trabalho efetivamente intersetorial e interdisciplinar para que essa resposta seja mais efetiva. Maior integralidade, mais participação de outros setores e disciplinas certamente ajudarão no sucesso da resposta à mais este grave problema que afeta a saúde de brasileiras e brasileiros.

 

Entrevista: Jéssica Marinho
Fotos: Jéssica Marinho

 

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