O dia 20 de novembro marca o Dia da Consciência Negra. A data faz referência ao dia da morte de Zumbi dos Palmares, o mais importante líder de um dos mais conhecidos quilombos da história da escravidão no Brasil, o Quilombo dos Palmares. Embora comemorada há mais de 30 anos por ativistas do movimento negro, a data só foi oficializada em 2011, pela Lei 12.519, como Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra. No calendário escolar, ela consta desde 2003.
A história dos negros no Brasil é marcada pela luta constante contra a discriminação que coloca essa população em vulnerabilidade social e econômica. No caso do HIV/aids, embora não sejam considerados populações-chave para a epidemia, os negros respondem por estatísticas preocupantes, por exemplo, em relação a mortes em consequência da doença.
“A discriminação acontece em todas as instituições e na saúde não é diferente. Já dizíamos isso na década de 80, numa época em que não havia dados e éramos acusados de vitimistas. Hoje, a saúde reconhece que existe racismo institucional, mas a Política Nacional da Saúde da População Negra com todas as suas diretrizes não foi implantada. Faz cinco anos que virou lei, mas na prática a gente não vê”, disse a ativista Edna Muniz, do Centro de Estudos e Relações do Trabalho e Desigualdades.
Além de estarem mais expostos ao risco de morte violenta intencional, os negros também integram o grupo de brasileiros que têm, em geral, piores indicadores de saúde, expressos na maior incidência de doenças e agravos com ou sem conexão direta entre si. É o que revelam as estatísticas oficiais.
Segundo o Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids (Unaids), Infecções Sexualmente Transmissíveis, mortes maternas, incluindo óbitos por abortos sépticos (quando o feto não é eliminado completamente causando infecção), hanseníase, tuberculose e doença de chagas, são problemas que atingem, em maior número, a população negra.
O que dizem os dados
Dados do último Boletim Epidemiológico de HIV e Aids do Ministério da Saúde apontam que entre os novos casos registrados no período de 2007 a junho de 2018, 46,1% foram entre brancos e 52,9% entre negros.
No sexo masculino, 48% dos casos ocorreram entre brancos e 50,9% entre negros. Já entre as mulheres, 41,9% dos casos se deram entre brancas e 57,1% entre negras. Ressalta-se, também o alto percentual de casos com a informação sobre raça/cor ignorada: 8,5%.
Quando distribuídos proporcionalmente, os óbitos notificados no ano de 2017 por raça/cor mostram que 60,3% foram entre negros 39,2% entre brancos, 0,2% entre amarelos e 0,2% entre indígenas. A proporção de óbitos entre mulheres negras foi superior à observada em homens negros: 63,3% e 58,8%, respectivamente. Realizando-se uma comparação entre os anos de 2007 e 2017, verificou-se queda de 23,8% na proporção de óbitos de pessoas brancas e crescimento de 25,3% na proporção de óbitos de pessoas negras.
Há algumas explicações para a desigualdade racial na saúde. Para o Unaids, a desigualdade econômica pesa, visto que a população negra tem menos poder financeiro para pagar um plano de saúde privado em comparação com a população branca. Há também o fato de a informalidade no emprego ser maior entre pretos e pardos – mulheres negras que trabalham como domésticas sem carteira assinada não têm direito a plano de saúde, por exemplo. E há a questão geográfica. “A rede do SUS está mais presente em regiões de classe média, e a população negra por fatores históricos está concentrada em regiões periféricas”, afirmou Irineu Barreto, analista do Sistema Estadual de Análise de Dados de São Paulo (Seade) que se dedicou à pesquisa da desigualdade racial. “E mesmo nas regiões mais pobres a população negra tem mais dificuldade do que a branca. A pobreza é mais cruel para os negros”.
Para o analista, é difícil concluir a partir de dados se o racismo na saúde tem diminuído ou aumentado no Brasil porque faltam pesquisas. A PNS de 2015 com detalhamento por raça e cor foi a primeira a fazê-lo. Mas há um indício disso nos números sobre mortalidade materna do SUS. Em 2004, 62.659 mulheres morreram em decorrência do parto, das quais 47% eram brancas e 43%, negras, a soma de pretas e pardas. Dez anos depois, em 2014, 63.408 mortes foram registradas. Delas, 42% eram brancas, e 53%, negras. Em um período de dez anos, portanto, não só aumentou o número de mulheres que continuam a morrer de complicações de uma gravidez, a condição da parcela negra piorou enquanto a da branca melhorou. Há a ressalva de que, em 2004, o preenchimento dos dados ainda era precário. Havia médicos que assinalavam “branca” em vez de “preta” ou “parda” ao descrever a paciente na ficha. Naquele ano, as investigações sobre as mortes das mães também eram muito menores. Independentemente de melhorar ou piorar, o fato é que o quadro é grave.
Fonte: Agência de Notícias da AIDS