No último mês, o Instituto de Tecnologia em Fármacos (Farmanguinhos), da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), anunciou que vai iniciar parceria com a gigante farmacêutica GSK-ViiV Healthcare em um processo de transferência de tecnologia, com o objetivo de aprimorar a produção nacional de antirretrovirais, incluindo um novo tratamento para HIV coformulado em uma pílula única diária.
Desde o início de 2017, o tratamento preferencial disponibilizado no SUS (Sistema Único da Saúde) para uma pessoa diagnosticada com infecção por HIV utiliza um esquema com 3 antirretrovirais administrados em 2 comprimidos ao dia (1 comprimido com Tenofovir e Lamivudina e outro comprimido com Dolutegravir). Agora, o Brasil vai começar a produzir o tratamento com apenas 2 antirretrovirais (Lamivudina e Dolutegravir).
Desde 1996, quando foi desenvolvido o tratamento da infecção por HIV, usamos a associação de 3 antirretrovirais para manter a replicação do vírus controlada, e assim restabelecer a imunidade e a saúde para as pessoas que vivem com essa infecção. De lá para cá, presenciamos uma impressionante melhora dos antirretrovirais disponíveis, tanto em termos de efeitos colaterais quanto de potência antiviral das drogas utilizadas.
Essa melhora fez com que, nos últimos anos, uma série de estudos passasse a avaliar a possibilidade de se reduzir de 3 para 2 o número de medicamentos no esquema terapêutico. Afinal, com drogas mais potentes, um esquema mais simples poderia já ser suficiente para manter o HIV controlado. Utilizando um esquema com menos drogas teríamos um tratamento mais barato e com menos efeitos colaterais.
O medicamento escolhido então para ser abandonado da trinca foi o Tenofovir, devido às alterações renais e ósseas que pode causar em parte dos seus usuários. E o resultado da retirada dessa droga foi surpreendente: tanto entre indivíduos recém-diagnosticados com infecção por HIV como entre os que já estavam em terapia antirretroviral, o tratamento simplificado, apenas com Lamivudina e Dolutegravir, se manteve tão eficaz quanto o triplo e causou significativamente menos alterações nos rins e nos ossos dos seus usuários.
A partir desses resultados, sucessivamente os países do mundo começaram a mudar suas recomendações de tratamento antirretroviral. Inicialmente, os Estados Unidos adotaram o esquema duplo em abril de 2019 e, 3 meses depois, foi a vez da União Europeia recomendar o tratamento simplificado.
Agora, com a transferência de tecnologia para que o Brasil produza os seus próprios comprimidos de Lamivudina e Dolutegravir, não só teremos acesso a um tratamento para o HIV de última geração, potente, seguro e em pílula única diária, mas também gastaremos menos recursos públicos com isso.
Para o uso do esquema antirretroviral duplo, no entanto, algumas precauções devem ser observadas. Ele não é recomendado para indivíduos que são coinfectados por HIV e Hepatite B simultaneamente, nem para aqueles que têm um vírus já resistente a algum dos medicamentos do esquema. A prescrição do tratamento simplificado, portanto, deve ser feita com base na avaliação cuidadosa do médico infectologista que estiver acompanhando o paciente.
Por meio de passos como esse, o Brasil tenta se alinhar ao que há de melhor no mundo para o cuidado das pessoas que vivem com HIV. Tornando assim cada vez mais fácil a manutenção de sua saúde e qualidade de vida, e derrubando as barreiras para que os avanços da ciência se tornem acessíveis para todas e todos.
Fonte: Viva Bem Uol – Ricardo Vasconcelos