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Ativistas afro-LGBTI alertam para preconceito duplo e cobram políticas públicas específicas


Washington Dias afirma que maioria dos gays negros luta por sobrevivência (Foto: Henrique Gomes Bastista/O Globo)

“Já não basta ser negra? Ser também sapatona é fogo”. A frase, segundo Bárbara Alves, diretora do coletivo Lesbi Bahia e integrante do Fórum Baiano LGBT, é mais comum que se imagina. E traduz um preconceito dentro de um outro movimento social. Questões como estas mostram a necessidade de criar políticas públicas que tratem destas duas dimensões desta população: ser negro e LGBTI.

— Há questões diferentes. Enquanto os gays brancos lutam por matrimônio e igualdade, a realidade para a imensa maioria dos negros gays é lutar pelo sobrevivência — afirmou Washington Dias, diretor da rede Afro LGBT.

O duplo preconceito foi tema de um seminário na noite desta quarta-feira em Salvador (BA), intitulado Resistências LGBTIs Negras, organizado pelo Instituto Internacional sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos, sediado em Washington.

No evento, Dias afirmou que todos os dados indicam que, quando uma pessoa é negra e LGBTI, suas vulnerabilidades são maiores. Ele cita, por exemplo, que há dois anos a incidência de HIV-Aids tem caído na população branca, mas crescido entre os negros. Da mesma forma, 80% dos homícios de mulheres transsexuais são negras.

— Mesmo no movimento negro há homofobia, como no movimento LGBTI há racismo. Eu fui o primeiro negro a presidir o Conselho nacional LGBT, e isso só ocorreu em 2018 — conta Dias.

Ele afirma que, se já dificuldades para a obtenção de dados sobre preconceito e violência à população LGBTI — as estatísticas são feitas por ONGs, não por governos — , o cruzamento destes problemas com o racismo fica ainda mais difícil. Dias acredita que, como a maior parte dos dados são extraídos do Disque100, há muita subnotificação.

Bárbara Alves, do LesBi Bahia, afirma que questões corriqueiras mostram um preconceito: ao fazer exames ginecológicos no SUS, mulheres lésbicas, a maioria negras, não podem optar por um espectro menor, indicado, por exemplo, para adolescentes.

Médicos não questionam a orientação e a identidade sexual das pacientes, o que as faz passar por constrangimentos, ou, no pior dos casos, abandonar a prevenção, ampliando o risco para estas mulheres.

— Agora no sistema privado de saúde, onde há mais brancas que negras, o tratamento é diferente, até pela forma da relação entre médico e paciente ser outra — disse ela.

Durante o debate, a transsexual Kukua Dada afirmou que o mesmo corre entre elas:

— O que vemos é que se uma trans é branca e loira ela é muito mais “passável” pela sociedade. Se é negra, tem muito mais chances de sofrer violência, achaques da política e discriminação — afirmou.

Para Carlos Quesada, diretor do Instituto Internacional sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos, o problema é estrutural. A solução só virá, em sua opinião, com políticas públicas e a conscientização de grupos de direitos humanos.

— O racismo potencializa a homofobia, da mesma forma que a homofobia turbina o racismo. Este grupo de pessoas precisa ser entendido com suas características — disse. — Somente o debate a conscientização podem mudar esta realidade.

Fonte: O Globo

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