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ABIA celebra memória e legado de Betinho após 20 anos de sua morte


Duas décadas se passaram desde a morte de Herbert de Sousa, o Betinho, um dos maiores precursores do movimento HIV/AIDS e Direitos Humanos no Brasil. O marco dos 20 anos de sua ausência coincidiu também com o Dia Nacional de Mobilização pela Política Brasileira de AIDS e foi celebrado na Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS (ABIA), fundada pelo sociólogo nos anos 80.

A Roda de Conversa “O Legado de Betinho para a AIDS: 20 Anos Depois” foi realizada na última quarta feira (09/08), data de sua morte, na sede da ABIA e foi comandada por Richard Parker (diretor-presidente da ONG) e Veriano Terto Jr (vice-presidente). E foi justamente Terto Jr quem abriu os diálogos enfatizando o pioneirismo das ações e gestos de Betinho para com a causa da epidemia de AIDS. “Betinho foi um grande ativista e sua importância para o HIV/AIDS é enorme, principalmente, nas questões de solidariedade e direitos humanos. Por isso é importante estarmos aqui hoje, para debatermos o que ele nos deixou e o que ainda podemos fazer”, afirmou. De acordo com Terto Jr, “ a ideia não é celebrar a morte e sim lembrar do legado deixado por esse ser tão especial. ” Após sua breve descrição, a palavra foi passada para Parker. Para ele, além de ter sido uma das primeiras pessoas a tocar na questão da AIDS, publicamente, o ativista “trouxe a ética para a AIDS. Que ela faz parte dessa política mais ampla e não dá para separar. Que é preciso ter um princípio da ética para esse enfrentamento. Por isso é importante manter essa memória dele viva porque para mim isso é um legado, que nos inspira a lutar contra as dificuldades e desmanches de política públicas”, enfatizou. Parker lembrou também que o contexto político onde Betinho começou sua luta, em plena ditadura, foi fundamental para os rumos tomados pelos direitos humanos naquele período.

Com um contexto político e social conturbado, analisar as possibilidades de penetração e inserção dos movimentos sociais para atuar é cada vez mais escasso. Entretanto, resistência é a palavra de ordem. “Eu descobri o HIV em 2011, passei por poucas e boas, quase morri ano passado porque eu perdi um rim e hoje só vivo com um. Não por conta do HIV, mas por uma negligência médica no hospital do Andaraí onde me tratava. Tentei me matar, tive depressão, mas eu estou aqui viva e resistindo. Por favor, não vamos parar. É preciso lutar contra o preconceito com pessoas soropositivas, negros, lésbicas e outros LGBT’s”, revelou emocionada a participante A.B. Questionado sobre a culpabilização das pessoas que vivem com HIV e AIDS pela infecção e transmissão por um dos jovens ativistas no evento, Parker foi categórico. “Parece que o estigma ficou mais forte ao longo do tempo. Talvez pela sinergia com outros fatores como raça, condição econômica, social, gênero e você não consegue enfrentar a epidemia só por um lado. E com o avanço das respostas biomédicas, você tem a volta da culpabilização, da criminalização que não deveria ter voltado”.

Sonia Corrêa, Pesquisadora associada e Co-coordenadora do Observatório de Sexualidade e Política (SPW/ABIA), rememorou uma das primeiras características da luta de Betinho contra a AIDS. Segundo ela, antigamente os hemofílicos (tipo de doença sanguínea) como o ativista eram vistos de maneira não estigmatizante, em contraponto as pessoas que se infectavam sexualmente como gays e prostitutas, por exemplo, eram marginalizadas. “Entretanto, naquele momento, o mais bonito de Betinho foi juntar todas essas populações e dizer que o problema não era maior ou menor de um ou de outro, era de todos. Ele trouxe a questão da AIDS como questão de Estado e não de setor”. “ Ele percebeu desde cedo a maneira como a violência estrutural caminha junto com a epidemia e que não devemos lutar só por aquilo que nos atinge diretamente, mas por tudo”, finalizou Corrêa. O avanço do conservadorismo e de políticos de extrema direita que sufocam e cerceiam limites de grupos minoritários também foram destacados na Roda. Sobre o assunto, Parker rechaçou que é preciso reagir para não perder as conquistas e até mesmo a esperança de continuar progredindo como foi há 30 anos atrás. “Para mim é fundamental que se conheça Betinho, porque tem muita gente que nem sabe quem ele é. É preciso que novas gerações lutem pelo que já foi conquistado”, completou o Assessor de Projetos da ABIA Juan Carlos Raxach. A capacidade de criticar seus pares e de mobilização que Betinho personificava em suas atitudes foi apontado como uma qualidade em baixa dentro do movimento social e da política brasileira.

A juventude positiva e sua mobilização (ou cooptação) pelo Estado também foi tema da Roda. Provocado sobre o que pensa disso, o diretor presidente disse que “a juventude é o futuro do país. Só que do mesmo jeito que tem jovens se fortalecendo em ações, tem jovens que apoiam o Bolsonaro”, alertou. “O maior fantasma realmente hoje de nós é a falta de cidadania. Nossos políticos são 95% deles corruptos. Como vamos enfrentar isso? Eu fico emocionado, mas nós estamos à deriva. E no aspecto da saúde já descemos ao fundo do poço”. O forte e emocionado relato de um dos participantes foi a tônica de diversos momentos da Roda de Conversa. A falta de políticas públicas e o desmanche daquilo que há (ou existia) não deixa espaço para novas ações. “Temos que refletir a maneira como pensamos a história. Resolver um problema não significa que ele está ultrapassado. O mundo funciona por ciclos e aí a educação é fundamental. E quando falamos de Betinho não é para sermos saudosistas, mas para vermos o que ele fez lá atrás que deu certo e trazer isso para o presente”, respondeu Terto Jr a indagação anterior e deixando no ar uma reflexão para os próximos passos do movimento social e seus pares.

O evento encerrou-se com uma confraternização entre os presentes que, posteriormente, seguiram para a Cinelândia para manifestar apoio ao Dia Nacional de Mobilização pela Política Brasileira de AIDS junto com outras organizações da sociedade civil.

Texto: Jean Pierry Oliveira e Jéssica Marinho
Fotos: Vagner de Almeida

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